Sobre trocentos rascunhos que não viram a luz do dia, camaros amarelos, e ilusão como prova de estar no jogo
Não gosto de espaçar as visitas, mas acontece que minha inspiração anda num limbo desgraçadinho. Não gosto disso, e, olha, não é frequente: eu sempre ando com a cabeça fervendo de indagações prontas para virarem textos. Mas tem vezes em que acontece, néam? No fundinho, mas bem no fundinho, deve ser a tal pressão do final do ano, certo que é. Retrospectivas, planos, contabilizações de acertos e erros - aquela cantilena conhecida que nos persegue, mesmo que não queiramos. Vocês não sabem, mas, geralmente, quando eu sofro de crises que me bloqueiam as palavras e me fazem sumir, é porque eu já estive por aqui e abri uns trocentos rascunhos que não viram a luz do dia. Eu ensaio, busco uma energia figadal - cês sabem, texto bom é aquele feito com as entranhas - mas aí vou me embananando. Em suma: não sai nada, porque eu já me distraí com a brisa, com o meu gato se espreguiçando com as patinhas coreografadas, com a manchete do jornal que, olha, dava uma crônica melhor e... fim. Lá vai o rascunho ser descartado. Pobre rascunho. Foi mal aí, rascunho, não foi a intenção. Eu iludi o rascunho.
Eu iludi vocês quando falei que não apareceria com frequência, em virtude de outros projetos aí - e o fato é que eu apareci mais do que previa e fiquei satisfeita com isso. E vocês ganharam mais postagens. E, se eu falo assim, é porque eu sei que vocês aparecem e leem - nem que seja para rir e se perguntar ''o que que essa mina quer com esse blog, escrevendo abobrinhas?''
Não que eu me dê importância, sabe, longe disso, mas sempre tem um zé para nos ridicularizar, colocar em xeque o que curtimos fazer - ainda que seja anonimamente. Os fazedores sempre serão massacrados por não fazedores e também por fazedores de outras coisas que não blogs, e o mundo gira e estamos conversados e vacinados. Eu acho o sertanejo universitário o nível musical mais degenerescente a que o ser humano pode se prestar, mas né, nem por isso os camaros amarelos deixam de circular, lépidos por aí, cagando para a minha existência. A galera segue arrochando, e eu sigo escrevendo abobrinhas. E é isso aí.
Mas, falando sobre ilusões (só para que este papo tenha alguma finalidade), é sempre uma coisa curiosa, né? Como iludimos, às vezes até sem querer. Talvez do jeito mais trivial possível, tipo, dizendo que ''vamos, sim, naquela festa, fulana'', mas, ainda assim, fazendo uma trapalhada gigante com a expectativa alheia. Como somos, também, iludidos por nada mais que nossos próprios pensamentos e vontade de enxergar o que queremos enxergar. O fato é que somos marionetes a serviço da ilusão, sempre, toda hora. Caminhando na rua, falando no telefone, fazendo planos mentalmente enquanto tomamos banho, cozinhando e esperando que a receita dê certo...
Lógico, existem níveis e níveis de ilusão - tá certo isso? - e ''sofrimentos'' condizentes (porque ilusão só faz sofrer, certo?), todavia não consigo ver só o lado obscuro delas, as ilusões. Às vezes, só quer dizer que a gente tentou. Tentou e não deu certo. Ok, na próxima, dá. A gente se ilude, se recupera, segue vivendo, porque se iludir é estar no jogo, por mais que seja cruel, sacaram? E, no fim, a gente sempre dá a volta por cima, nem venham com papinho derrotista - que o digam meus rascunhos relegados ao ostracismo da lixeira, que, de uma forma ou outra, trataram de existir em outras postagens. Eles estão aqui também.
Auxiliou no post:
Fly away from here - Aerosmith
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