É de uma dificuldade aterradora tentar mudar um discurso opressor internalizado em nós, entranhado em nossa vivência desde o dia em que nos conhecemos por gente. É como dar murros em pontas de facas. Sangra. Dói. Desgasta. ''Por que se incomodar em mudar?'' - dirão alguns. Oras, porque estamos vivos, e resignação é morte. Se o Darcy Ribeiro disse que há duas opções na vida e que uma delas é a resignação, digo que nunca deixarei de me indignar. Enquanto estiver viva, hei de me indignar.
Eu nunca dei muita bola para o feminismo - como muitxs de vocês. Para ser mais franca ainda, eu achava que, sim, isso era coisa de gente sem mais o que fazer. Ora bolas, se a gente já pode votar e fazer faculdades e etc, o que essas minas ainda querem com isso? Tolinha essa Bruna...
Só que, buscando alguns arquivos empoeirados pelo tempo - lá da aurora da minha infância - me dei conta de que ele nunca esteve tão forte em mim. Desde sempre. Como quando meu pai me buscava no colégio, me via jogando futebol e dizia, receoso de que alguém me machucasse: ''Bruna, isso não é coisa de menina'', e eu ficava meio prostrada, indignada com aquilo, porque, para mim, grandiscoisa jogar com a piazada, qualé a tua, papai??? Claro, dirá você aí que isso não passa de uma opressãozinha-classe-média (e é!!!) mas é por pensamentos como esse que fui criada do jeito que o status quo gosta. Ainda que eu tenha ensaiado uma rebeldia, ela sempre foi superficialmente questionadora, não militante e, pior, reprodutora natural de preconceitos contra as mulheres: calar também é ser conivente na maioria das vezes. Não me culpem, sinceramente, é muito fácil manter tal posição, uma vez que ela é amparada pela mídia hegemônica (de forma escancarada e sutil), pela nossa amada família, pelos nossos professores, pelo governo, por praticamente todos que nos rodeiam - o que não quer dizer, entretanto, que eles sejam do mal, em um sentido cruel da palavra. Vocês sabem, estamos mergulhados neste marzão de lixo há tempos...
Mas podemos frear a ignorância. Se quisermos, claro. Hoje, as promoções de corte de cabelo, de manicure, de depilação, de lojas de roupas e o escambau pipocarão em vossas timelines, como se realmente o universo de ser mulher se restringisse a essas amenidades cotidianas. Mas aí vocês podem lembrar que há mulheres ainda apanhando de seus companheiros, sendo assassinadas por eles, morrendo em abortos clandestinos, sendo marginalizadas pela sua orientação sexual, por não quererem ser mães e donas de casa - e por serem apenas donas de casa também - sendo vítimas de estupros nojentos e sendo culpabilizadas por eles devido à roupa que usavam, entre outras violências pouco nítidas para quem não quer enxergar. Em suma, esta postagem é mais um bilhete carinhoso, dizendo que eu tô com vocês, gurias! Posso não ter estado sempre em atitudes, mas sempre estive por instinto. E ele é que me trouxe até aqui e me fez escrever isso.
É muito mais difícil destruir o impalpável do que
o real.
— Virgínia Woolf
Dentro de nós é forte o medo da liberdade.
— Germaine Greer
Auxiliou no post:
Away - The Cranberries
Eu nunca dei muita bola para o feminismo - como muitxs de vocês. Para ser mais franca ainda, eu achava que, sim, isso era coisa de gente sem mais o que fazer. Ora bolas, se a gente já pode votar e fazer faculdades e etc, o que essas minas ainda querem com isso? Tolinha essa Bruna...
Só que, buscando alguns arquivos empoeirados pelo tempo - lá da aurora da minha infância - me dei conta de que ele nunca esteve tão forte em mim. Desde sempre. Como quando meu pai me buscava no colégio, me via jogando futebol e dizia, receoso de que alguém me machucasse: ''Bruna, isso não é coisa de menina'', e eu ficava meio prostrada, indignada com aquilo, porque, para mim, grandiscoisa jogar com a piazada, qualé a tua, papai??? Claro, dirá você aí que isso não passa de uma opressãozinha-classe-média (e é!!!) mas é por pensamentos como esse que fui criada do jeito que o status quo gosta. Ainda que eu tenha ensaiado uma rebeldia, ela sempre foi superficialmente questionadora, não militante e, pior, reprodutora natural de preconceitos contra as mulheres: calar também é ser conivente na maioria das vezes. Não me culpem, sinceramente, é muito fácil manter tal posição, uma vez que ela é amparada pela mídia hegemônica (de forma escancarada e sutil), pela nossa amada família, pelos nossos professores, pelo governo, por praticamente todos que nos rodeiam - o que não quer dizer, entretanto, que eles sejam do mal, em um sentido cruel da palavra. Vocês sabem, estamos mergulhados neste marzão de lixo há tempos...
Mas podemos frear a ignorância. Se quisermos, claro. Hoje, as promoções de corte de cabelo, de manicure, de depilação, de lojas de roupas e o escambau pipocarão em vossas timelines, como se realmente o universo de ser mulher se restringisse a essas amenidades cotidianas. Mas aí vocês podem lembrar que há mulheres ainda apanhando de seus companheiros, sendo assassinadas por eles, morrendo em abortos clandestinos, sendo marginalizadas pela sua orientação sexual, por não quererem ser mães e donas de casa - e por serem apenas donas de casa também - sendo vítimas de estupros nojentos e sendo culpabilizadas por eles devido à roupa que usavam, entre outras violências pouco nítidas para quem não quer enxergar. Em suma, esta postagem é mais um bilhete carinhoso, dizendo que eu tô com vocês, gurias! Posso não ter estado sempre em atitudes, mas sempre estive por instinto. E ele é que me trouxe até aqui e me fez escrever isso.
É muito mais difícil destruir o impalpável do que
o real.
— Virgínia Woolf
Dentro de nós é forte o medo da liberdade.
— Germaine Greer
Auxiliou no post:
Away - The Cranberries
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