Pular para o conteúdo principal

Um casal problemático

Era um casal problemático. Talvez chato - para quem olhava de fora, sucumbindo à redoma de vidro onde os dois permaneciam presos. Ela, inconstante. Ele, prático demais. Ela amava ele, mas queria brincar de ser livre, numa liberdade de expressão que não apetecia ele. Ele, embora prático, amava ela de um jeito que a praticidade não conhece, com encantamento, com devoção, com medos escondidos. Os medos às vezes viravam brigas, mas eles não sabiam brigar, uma vez que não entendiam os protocolos da situação. Se brigarmos, não falamos mais um com o outro, é isso? Se brigarmos, retiro meus vinis do teu quarto? Logo, nunca brigavam, não no modo convencional - apenas batiam portas, exageravam nos goles, debochavam da previsibilidade um do outro. Ela, artista, pintava quadros. Ele, metódico, pintava na área para dizer que agora está tudo bem, até comprou ingressos para irem àquele concerto de rock de que falaram semana passada, topa?
E eles sofriam, pois, apesar destas discrepâncias emocionais, se amavam. E não sabiam por que, mas não ficavam indiferentes à presença alheia. Ela, do jeito dela, tentava demonstrar que o queria perto, que sentia o sangue quente perto dele. Para ele, faltava calor. Ele queria mais, era quase um assaltante emocional, talvez ele é quem sofresse mais. E não deixava ela partir, por mais que sua presença quase sempre fizesse mal a seus planos. É, ele gostava de fazer planos, era um contabilizador. Ela queria viver o presente e queria menos números a dois. Só queria os dois. E a forma como ele tentava condicionar as ações dela a fazia fugir. E a forma como ela fumava o fazia fugir. Mas eles sempre fugiam para o mesmo lugar e logo as campainhas já começavam a tocar em ritmo frenético. E os corações pulavam mais uma vez. Ao menos até amanhã, a noite não precisa passar tão rápido. 
E era tão irônico que eles matavam o amor que sentiam, de forma tão velada, tão venosa, tão necessária, como se ele precisasse morrer para finalmente entenderem que se queriam mais que tudo.    



Auxiliou no post:

Come On - Letters to Cleo   






Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

5 ANOS DE BLOG - PARTICIPE DA PROMOSHARE

Hoje, nós da empresa, completamos 5 anos de blog. Vamos dar o play para entrar no clima:                         #POLÊMICA: sempre preferi o parabéns da Angélica em vez de o da Xuxa. O que não quer dizer que eu ame a Angélica, claro, por mim ela pode ir pra casa do caralho. ENFIM, VAMOS CELEBRAR! 5 ANOS DE MERDA ININTERRUPTA AQUI! UHUL, HEIN? Era 22 de dezembro de 2010, estava euzinha encerrando mais um semestre da faculdade de Jornalismo, meio desgraçada da cabeça (sempre, né), entediadíssima no Orkut, quando finalmente tomei coragem e decidi dar a cara a tapa. Trouxe todas as minhas tralhas para o Blogspot e a esperança de mudar alguma coisa. Infindáveis crônicas começaram a ganhar o mundo e a me deixar mais desgraçada da cabeça ainda: sei lá, escrever é uma forma de ficar nua, de se deixar analisar, de ser sincero até a última gota, e isso nem sempre é bom negócio. Mas, enfim, felizmente tenho sobrevivido sem grandes traumas - mas não sem grandes catarses, por isso esse n

Família Felipe Neto

Eu já queria falar sobre isso há um bom tempo, e, enquanto não criar vergonha nessa cara e entrar num mestrado para matar minha curiosidade de por que caralhos as pessoas dão audiência para pessoas tão bizarras e nada a ver, a gente vai ter que escrever sobre isso aqui. Quando eu falo ''a gente'', me refiro a mim e às vozes que habitam minha cabeça, tá, queridos? Youtubers... youtubers... sim, Bruna, está acontecendo e faz tempo. Que desgraça essa gente! Ó, pai, por que me abandonaste? Quanto tempo eu dormi? Estamos vivendo uma era de espetacularização tão idiota, mas tão idiota que me faltam palavras, é sério, eu só consigo sentir - como diria o fatídico meme . Não tem a mínima condição de manter a sanidade mental, querendo estudar, trabalhar, evoluir quando pegar uma câmera, do celular mesmo, sair falando um monte de merda e enriquecer com isso ficou tão fácil. Vamos usar um case bem ridículo aqui? Vamos.  Dia desses, esta comunicóloga que vos fala, fazendo suas

Flores no lamaçal de creme de avelã

Tenho feito um severo exercício de autocrítica nos últimos tempos - exercício esse que, somado a um problema pessoal bem pontual, me deixou sem tesão algum de escrever. Mas voltei para uma transadinha rápida e certeira. Um mea culpa inspirado nos velhos tempos - desta vez sem o deboche costumeiro. Realmente quero me retratar. H á alguns meses, q uando escrevi, estupefata de indignações diversas, sobre youtubers, eu nunca estive tão certa do que escrevia. Sigo achando que o Youtube amplificou a voz dos imbecis e vem cooptando principalmente crianças a uma sintomática era da baboseira - entre trolladas épicas envolvendo mães e banheiras cheias de nutella , criou-se um nicho bizarro cujo terreno é a falta de discernimento infantil infelizmente. Só que foi aí que residiu meu erro: reduzir a plataforma a um lamaçal de creme de avelã - e nada mais. Não me ative ao fato de que ali coexistem muitos canais interessantíssimos sobre os mais diferentes ramos do conhecimento hum ano , inclusive