Para mim, o mundo não é dos sinceros, dos que cultuam a lisura do caráter até as últimas conseqüências como se esse ato valesse uma vida. É terrível admitir isso, mas não há mais espaço para os que prezam a verdade em suas relações, de um modo geral. "Credo, essa aí acaba de prever o apocalipse", dirão alguns, mas sei bem do que estou falando. A falta de sinceridade não é de agora, é inerente a todos e se manifesta nas situações mais corriqueiras de nossas vidas, seja quando aquela criatura sem o mínimo tato para vestir-se pede nossa opinião quanto a sua escolha de figurino ou quando a gente tem de dar um basta em uma situação que há tempos nos faz perder a paciência.
Obviamente, aqui me refiro àquela hipocrisia social de que somos partidários, principalmente, para não alimentar inimizades, não à falsidade escancarada e feita com o intuito de ferir as pessoas de nossas relações. Embora pareça confuso, trata-se apenas de uma linha tênue que separa as duas situações: não há como fugir de saias justas em que, inevitavelmente, às vezes, temos de assentir com a cabeça quando queremos fazer o contrário. Agora, extinguir por completo a sinceridade – aquela que faz você ficar de bem consigo mesmo quando deita para dormir o sono dos justos – já é inadmissível. Certamente, há quem não concorde com essa minha opinião, mas espero estar sendo entendida nessa tentativa de explicar como sempre se deram/dão as relações humanas. A questão é que isso existe e é um fato para o qual muita gente torce o nariz, dizendo: “comigo é diferente, detesto falsidade”. Balela.
Mas agora chegamos ao cerne da discussão: o que dizer quando sua melhor amiga pergunta se tem alguma chance com o homem mais lindo que já ousou pisar na face da terra? (me sinto, no exato momento, como uma mediadora daqueles testezinhos muquiranas da revista Capricho, mas faz-se necessário ilustrar nosso dilema) Diz a verdade, argumentando que ele, provavelmente, pega muita mulher por aí e, podendo escolher a fulana que bem entender pra dormir em sua cama, nunca olhará para ela, que é tão insossa e pesa 90 quilos de puro amor? Ou ilude a coitada, afirmando com veemência que tudo na vida é possível e que não há barreira que não seja transposta pelo amor verdadeiro? (afinal, amiga é amiga, mesmo que seja para fazer a outra sofrer achando que terá uma oportunidade com o objeto masculino de sua cobiça). Pensem e vejam se já não estiveram em uma situação semelhante.
Pareci ácida? Sem coração? Mereço passagem só de ida para o inferno? Pouco me importa, só sei que isso é um baita exemplo, para avaliarmos a quantas anda nosso nível de “sinceridade”. Ouso dizer que ela é um sonho bonito. Lindo mesmo, quase como o do comunismo, da igualdade entre os povos ou o de homens fiéis. Uma verdadeira utopia com que perdemos o sono todos os dias, sem nos darmos conta de que é apenas uma manifestação do mundo anormal que habitamos. Viver com o mínimo de dignidade já está de bom tamanho.
Comentários